Diferenciação entre Pequena Propriedade Rural e Propriedade Rural Familiar.
- Pommer Advocacia
- 5 de nov. de 2019
- 4 min de leitura
Autoras:
Fernanda Vannier S. Pinto
Adriana V. Pommer
Não é raro ver que os conceitos de pequena propriedade rural e propriedade rural familiar sofrem com certa confusão quanto ao seu conteúdo para fins de aplicação ou não do embargo cautelar que visa a proteção ambiental, principalmente quando se trata de propriedade cuja atividade desenvolvida se destina à subsistência familiar.
A legislação infraconstitucional em vigor dá proteção ao pequeno produtor rural que desenvolve atividades de subsistência em sua propriedade. Essa direção é efeito da previsão constitucional disposta nos artigos 5º, XXVI e 185, I, cujo critério fundamental é eminentemente social.
Nesse sentido, o Decreto 6514/2008, em seu artigo 16, dispõe que “No caso de áreas irregularmente desmatadas ou queimadas, o agente autuante embargará quaisquer obras ou atividades nelas localizadas ou desenvolvidas, excetuando as atividades de subsistência.”
A mesma ideia consta no §1º do artigo 51 do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), onde se lê: “O embargo restringe-se aos locais onde efetivamente ocorreu o desmatamento ilegal, não alcançando as atividades de subsistência ou as demais atividades realizadas no imóvel não relacionadas com a infração”.
Vale, então, definir “pequena propriedade rural” e “atividade de subsistência”, esta última compreendida no sentido de exploração de agricultura familiar, cuja verificação faz cessar os efeitos do embargo cautelar.
Na esfera do Direito Agrário existem duas formas de classificação do imóvel agrário, quanto à dimensão e quanto à produtividade[1], sendo ainda uma classificação feita pelo Estatuto da Terra e outra pela Constituição Federal.
Assim, o imóvel rural é classificado pelo Estatuto da Terra como: propriedade familiar; minifúndio e latifúndio; já pela Constituição Federal é definido como pequena, média e grande propriedade (art. 185, inc. II da CF/88).
No artigo 4º da Lei 8.629/1993 surgiu a definição da pequena propriedade rural, cuja alínea ‘a’ do inciso I dispunha como sendo o imóvel rural “de área compreendida entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais”.
O módulo fiscal foi instituído inicialmente para cálculo do ITR (imposto territorial rural). Cada município tem o seu módulo fiscal, sempre fixado em hectares pelo INCRA através de Instrução Especial, que leva em conta diversos fatores (art. 4º, Decreto 84.685/1980). Em seguida, verifica-se a sua aplicação para classificação do tamanho do imóvel rural.
A Lei n. 11.326/2006, que estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais, considerando o módulo fiscal como unidade de medida, conceituou a agricultura familiar, fazendo constar como um dos seus requisitos a pequena propriedade rural:
Art. 3o Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos:
I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais;
II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;
III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo;
IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.
A Lei 12.651/2012 definiu no inciso V do artigo 3º que a pequena propriedade ou posse rural familiar é “aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentos e projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art. 3o da Lei no 11.326, de 24 de julho de 2006”.
O conceito de atividade de subsistência também foi regulamentado pela IN 10/2012 do IBAMA (art. 33, §1º), assim consideradas “aquelas realizadas na pequena propriedade ou posse rural familiar, explorada mediante o trabalho pessoal do proprietário ou posseiro e de sua família, admitida a ajuda eventual de terceiro, cuja renda bruta seja proveniente de atividades ou usos agrícolas, pecuários ou silviculturais ou de extrativismo rural em no mínimo 80%”.
Por sua vez, o art. 2º, inciso III, alínea “a” e inciso X do Decreto Estadual n. 1031/2017 – SEFAZ/MT assim define:
Art. 2º Para os efeitos deste decreto, entende-se por:
III - Propriedade/Posse rural: prédio rústico constituída por um ou vários imóveis rurais, podendo ser classificada como:
a) pequena propriedade ou posse: com área entre 1 (um) a 4 (quatro) módulos fiscais;
X - Pequena propriedade ou posse rural familiar: aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentos e projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art. 3º da Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho de 2006;
Sendo assim, pode um determinado imóvel rural figurar como uma pequena propriedade e ao mesmo tempo como propriedade familiar, ou apenas como uma das duas.
No entanto, para que a atividade seja considerada de agricultura familiar subsistência, é preciso aglutinar a condição de pequena propriedade rural, inferior a 4 módulos fiscais (inciso II, ‘a’) com a utilização de mão-de-obra e gestão familiar, de onde o agricultor obtenha a maior parte da renda (inciso X).
Logo, a pequena propriedade rural, compreendido como critério de classificação relacionado à extensão territorial, é apenas um dos requisitos para a configuração da propriedade familiar destinada à subsistência e, por isso mesmo, com ela não se confunde, de modo que para a aplicação da exceção ao embargo cautelar contida nos artigos 16 do Decreto 6514/2008 e 51, §1º do Código Florestal, faz-se necessário preencher os demais requisitos exigidos (mão-de-obra e gestão familiares, além de fonte principal da renda).
[1] CARVALHO. Edson Ferreira. Manual didático de direito agrário. Curitiba: Juruá, 2010, p. 165/174.
Sobre as autoras:

Fernanda Vannier S. Pinto: É advogada com ênfase em agronegócio e direito empresarial, formada pela Universidade Federal de Mato Grosso, pós-graduanda em Direito Ambiental pela Universidade Federal do Paraná.
Foi membro da Comissão de Estudos da Lei de Falência e Recuperação de Empresas da OAB/MT.
É associada da POMMER Advocacia e advogada na área cível, ambiental e empresarial.

Adriana V. Pommer: É advogada e administradora com ênfase em agronegócio pela Universidade Estadual de Mato Grosso, Mestre em Direito Agrário e Direito Ambiental pela Universidade Federal de Mato Grosso.
Integrou o corpo docente da Universidade Estadual de Mato Grosso, da Universidade Federal de Mato Grosso e da Faculdade de Sinop. Professora das disciplinas de Direito Agrário, Direito Ambiental e Processo Civil.
É Presidente da Comissão de Direito do Meio Ambiente e Agronegócio na 6ª Subseção da OAB/MT, Membro da Comissão do Direito da Mulher da OAB/Sinop e Membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB Mato Grosso.
Conselheira Titular do Conselho Municipal de Meio Ambiente de Sinop/MT.
Bom dia, sim é possível, a abertura da inscrição de produtor somente não é possível em área menor que a Fração Mínima de Parcelamento do imóvel rural.
Atenciosamente, Adriana V. Pommer
É possível tirar o bloco ou cadastro de produtor rural, ainda que seja de subsistência, com uma terra inferior a um módulo fiscal?